musa inspiradora

Tentava se afogar dentro do copo de vodka. Aquela tarde tinha sido especialmente problemática.
Não sabia mais onde enfiar os problemas, e aquela mensagem de adeus, definitivo, o deixou bastante perturbado.

Evitou ir pra casa. Sentiria o vazio deixado, as coisas fora de lugar, a estante isolada sem os livros de arquitetura, os vasos sem flores.
O perfume que invadia os cômodos enquanto ela desfilava de uma porta a outra.
Nada seria como antes, sem sua presença espirituosa e reclamona. “você precisa se abrir” ela dizia e ele sorria.
Sabia, mas não conseguia evitar.

Levantou a cabeça procurando o garçom pra pedir outra dose, afogaria as mágoas naquele copo, por honra.
Quando percebeu um sorriso brilhante. Os olhos pareciam pedras preciosas reluzentes que tinham sido encaixadas com perfeição naquele rosto.

Não era um rosto perfeito, nem tão bonito de capa de revista, mas tinha algo naquele sorriso que o encantou. Era franco, sem recato.
Ela mexia nos cabelos, tirando os fios que teimavam em cair sobre os olhos, e parecia uma melodia tocada por um violino. Cadenciado.

Foi interrompido do devaneio quando a garçonete se aproximou perguntando se queria outra dose. Ele aceitou automaticamente, não conseguia desviar o olhar.
Notava suas curvas em perfeita harmonia, enquanto ela se mexia na cadeira, em suas gargalhadas despudoradas, quase eróticas.
Sentiu o corpo em comichões. Precisava conhecê-la, chegar perto sentir seu cheiro. imaginou que tinha um aroma selvagem.

Observava cada detalhe, contorno da boca que emoldurava os dentes imperfeitos, os cílios que batiam como asas de borboleta pousada na flor.
As bochechas que rosavam a cada sorriso, o pescoço fino envolto pelos cabelos escuros. Os ombros que curvavam pra frente, pra ouvir melhor o assunto.
Quando se deu conta que ela o viu. Séria, apenas olhou. Então sorriu, tímida, abaixando o queixo e fazendo um brinde.

Se sentiu extremamente poderoso naquele momento. Percebeu que poderia ganhar o mundo.
Conseguiu afogar os problemas, não no copo de vodka, mas no sorriso inebriante daquela moça.
Retribuiu o brinde e o sorriso.

Lembrou-se da casa vazia. Pediu a conta.
Não era a hora de preenchê-la agora. Mas o fulgor daquele sorriso clareou sua mente.
Colocaria ordem na sua bagunça interna. Não havia espaço pra nada antes de arrumar a si mesmo.

 

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